RESUMO
O plexo braquial é responsável pela inervação sensitiva e motora do membro
superior. As lesões do plexo braquial são decorrentes de acidentes, parto e
síndromes compressivas. No entanto, a grande maioria das paralisias é de
origem traumática e envolve a quase totalidade das raízes. Descrevo o caso de
um paciente do sexo masculino, 36 anos, vítima de atropelamento, apresentando
lesão de plexo braquial do tipo avulsão das raízes dos troncos superior (C5 e
C6) e médio (C7); submetido à reparação cirúrgica. Observando que após cinco
meses de tratamento fisioterapêutico, o mesmo obteve alguma melhora na
organização corporal, movimentação ativa nas articulações do punho e cotovelo,
recuperação parcial da sensibilidade e diminuição do quadro álgico.
Palavras-chave: Plexo braquial; lesão do
nervo; reabilitação.
ABSTRACT
The plexus brachial its responsible for sensitive enervation and motor of the
superior member. The brachial plexus’ injuries are current of accidents,
childbirth and compressive syndrome. However, the greater number of paralysis
its traumatic origin and involves almost totality of bases. Describing case
of patient male sex, thirty-six years old, victim of
trample, introducing Brachial Plexus injuries of sort avulsion of root base
(superior C5 e C6) and medium ( C7 ); subjected the surgery reparation.
Observing after five months of some improvement in corporeal scheme’s
organization, active movimentation in wrist and elbow articulation,
sensibility partial recuperation and diminution of pain symptom.
Key words: Brachial plexus; nerve
injuries; rehabilitation.
INTRODUÇÃO
Os primeiros relatos sobre lesão do plexo braquial por mecanismo de tração de
origem obstétrica surgiram em 1764, por Smelie. Somente em 1872, Duchene de
Boulogne descreveu quatro crianças com paralisia alta do plexo braquial
resultante do esforço na liberação dos ombros durante o parto. Já em 1874, Erb
se referiu à paralisia alta do plexo braquial em adultos, porém com as mesmas
características da descrição de Duchene. Augusta Klumpke, em 1885, explicou o
sinal de Horner na lesão do plexo braquial por avulsão das raízes C8-T1 com
envolvimento do sistema nervoso simpático cervical homolateral. Esta se uniu a
Dejerine dando origem à denominação nas paralisias baixas do plexo braquial
(paralisia de Dejerine-Klumpke), da mesma forma que Erb-Duchene nas paralisias
altas. 1,5
Atualmente, a maioria das lesões de plexo braquial é traumática não
obstétrica, causada principalmente por acidentes de trânsito. Este fator tem
grande importância sócio-econômica _ obtém grave repercussão na vida familiar,
profissional e na qualidade de vida do indivíduo _ em razão da faixa etária
acometida. 1,2
Os nervos periféricos são constituídos por grupos de axônios e seus
envoltórios de tecido conjuntivo. Transportam a informação entre os efetores
ou os receptores situados na periferia e o corpo celular, situado na medula no
caso dos nervos motores e no gânglio espinhal no caso dos nervos sensitivos.
Salvo em casos particulares, as lesões nervosas periféricas não acarretam a
morte do corpo celular e em teoria a regeneração é possível. Esta regeneração
potencial do nervo se baseia nos princípios da reabilitação. 2,3
Existe uma discordância entre os trabalhos experimentais e a prática clínica.
Muitos dos dados obtidos em estudos não apresentam ainda uma aplicação
clínica. Mas, todos os protocolos de reabilitação devem basear-se no
conhecimento da fisiologia dos nervos periféricos. 3
Os objetivos desse estudo foram: 1) estudar o caso de uma lesão de plexo
braquial traumática nos níveis C5, C6 e C7; 2) oferecer ao Fisioterapeuta as
informações necessárias para uma avaliação de plexo braquial; 3) e
proporcionar uma melhor qualidade de vida ao paciente.
RELATO DE CASO
Paciente sexo masculino, 36 anos, carpinteiro, dominância à direita, vítima de
atropelamento em Junho/2003, apresentando lesão de plexo braquial à direita do
tipo avulsão de C5, C6 e C7 sem lesões associadas. Foi submetido a
procedimentos cirúrgicos no hospital Souza Aguiar em fevereiro/2004, onde
realizou neurotização de nervo cubital para nervo músculo-cutâneo e de nervo
acessório para nervo supra-escapular. Em Julho/2004 procurou atendimento
fisioterapêutico, apresentando quadro álgico em região cervical e paralisia de
membro superior direito, passando por uma avaliação. (Fig. 1)

Fig. 1
AVALIAÇÃO FISIOTERAPÊUTICA
* Inspeção da pele: hipotrofia de membro superior direito e alterações
tróficas (pele ressecada);
* Sinais especiais: Sinal de Horner: negativo
Sinal da dançarina balinesa: positivo (Fig.2)
Sinal da escápula alada: positivo (Fig.3)

(Fig.2)

(Fig.3)
* Sensibilidade:
- Zona autônoma: nervo mediano – hipoestesia (+++/++++)
nervo ulnar – hipoestesia (+/++++)
- Dolorosa: região tenar – positivo
região hipotenar – hipoestesia
- Teste de Tinel: positivo (supra e infraclaviculares);
- Estereognosia: normal;
-Térmica: anestesia do dedo polegar, hipoestesia do indicador e região lateral
do antebraço;
- Discriminativa (Prova de Weber): normal para nervos mediano e ulnar;
* Avaliação Motora:
- Amplitude de movimento: com limitação para flexão de ombro (40º), supinação
(70º), flexão de punho (60º) e extensão de punho (40º);
- Força muscular:
elevação de ombro – grau 4
abdução de ombro – grau 0
adução de ombro – grau 0
rotação externa – grau 1
rotação interna – grau 1
flexão anterior de ombro – grau 0
extensão de ombro – grau 0
flexão de cotovelo – grau 2
extensão de cotovelo – grau 0
pronação – grau 4
supinação – grau 0
extensão de punho – grau 0
flexão de punho – grau 4
* Avaliação Motora da Mão:
- musculatura intrínseca
eminência hipotenar (abdução e flexão do 5º dedo preservadas);
eminência tenar (adução do polegar preservada e incapacidade para abduzir o
polegar);
- interósseos: Prova de Egawa preservada;
* Reflexos: arreflexia biciptal (C5 e C6), estilorradial (C6) e triciptal
(C7);
* Avaliação Global: assimetria de ombros (ombro direito elevado), hipotrofia
da região periescapular (escápula direita alada), aumento da cifose dorsal;
cabeça protusa e rodada para a esquerda e, subluxação da cabeça umeral à
direita (Sinal de Dragona positivo). (Fig.4)

(Fig.4)
Com base nos dados provenientes da avaliação realizada,3,5,6 um plano
fisioterapêutico foi conduzido em ambiente ambulatorial, duas vezes por semana
durante uma hora, explorando-se vários decúbitos para a realização destes
exercícios, visando:1) diminuir as aderências do tecido cicatricial; 2)
diminuir o quadro álgico da região cervical, através de manobras manuais de
mobilização tecidual e posicionamentos; 3) manter o amplitude normal de
movimentos articulares, evitando retrações cápsulo-ligamentosas das
articulações comprometidas,por meio de mobilizações articulares, exercícios
passivos e assistidos ; 4) manter a musculatura antagonista através de
exercícios de alongamento (respeitando o limite da dor); 5) aumentar a
sensibilidade proprioceptiva 7, estimular os reflexos de flexão através de
manobras de Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva (Método Kabat) 8,
exercícios de dissociação de cinturas em cadeia fechada utilizando a bola
Suíça 9 e técnicas de dessensibilização; 6) melhorar a organização do esquema
corporal através de exercícios associados ao trabalho respiratório, buscando o
aumento da expansibilidade torácica.10
DISCUSSÃO
As lesões do plexo braquial podem ter diversas etiologias, tais como colisões
de motocicleta, bicicleta, automóveis, atropelamentos, quedas de altura,
quedas de objetos sobre o ombro, acidentes industriais, projéteis de arma de
fogo, arma branca, tocotraumatismo e síndrome do desfiladeiro torácico. 1
Segundo a classificação de Seddon (proposta em 1943), o paciente em questão é
portador do terceiro nível de lesão, denominada neurotmese, que implica a
perda da continuidade total ou parcial de um nervo periférico, a qual não é
possível a regeneração espontânea. Já Sunderland propôs uma classificação mais
precisa subdividindo a neurotmese em três tipos. O tipo 3 de Sunderland
corresponde a uma perda da continuidade do axônio e dos tecidos endoneurais,
mas o perineuro está intacto. Esta lesão é observada nas compressões
importantes e nos traumatismos por alongamento. O tipo 4 soma-se ao tipo 3 a
uma perda da continuidade do perineuro (e portanto, da barreira
hematoencefálica que representa) com conservação do epineuro, enquanto que o
tipo 5 consiste em uma ruptura do epineuro como a que se observa nas lesões
por secção. A principal limitação destas classificações é sua falta de aparato
prognóstico, já que a gravidade da lesão só costuma ser conhecida
posteriormente. 3,5,6
Nas avulsões radiculares do plexo braquial e nos traumatismos por alongamento,
há possibilidade de reinervar a parte distal do plexo realizando anastomoses (neurotizações)
com nervos vizinhos. Estas anastomoses são apenas paliativas e não devemos
esperar resultados funcionais completos. Têm apenas a finalidade de evitar
amputações, as dores crônicas e também para conservar o trofismo do membro
pela recuperação parcial da sensibilidade. 1,4
A maioria dos autores afirma que os resultados deste tipo de cirurgia ainda
não são satisfatórios sob o ponto de vista da motricidade e da sensibilidade,
sendo esta última, ainda mais difícil. 1,3
Nota-se que, o resultado das neurotizações é muito variável, em alguns casos
há diminuição das dores, em outros não há nenhuma influência nos sintomas
dolorosos e, grande parte dos pacientes operados não se encontra membro
fantasma. 3,4,10
CONCLUSÃO
O tratamento reabilitador de um paciente com uma lesão do plexo braquial é um
trabalho em longo prazo e complexo. É necessário repetir periodicamente as
avaliações do diagnóstico fisioterapêutico (funcional) já que se trata de um
processo evolutivo. Deve ser ensinado ao paciente a se proteger e a
potencializar ao máximo suas capacidades, uma vez que as seqüelas são
freqüentes e requerem, às vezes, a aprendizagem de compensações.
Apesar da gravidade da lesão, foi adquirida uma diminuição do quadro álgico na
região cervical e um grau de funcionalidade que o permitiu o uso assistido da
mão nas suas atividades da vida diária, ou seja, consegue escovar os dentes,
pentear o cabelo e alimentar-se com o membro acometido. Este, porém, retornará
a microcirurgia para uma segunda intervenção cirúrgica objetivando a melhora
da função da mão.
Ressalta-se ainda, a importância de uma equipe multidisciplinar e,
principalmente, interdisciplinar ao se tratar de plexopatia braquial, pois a
abordagem fisioterapêutica se baseia no diagnóstico, no nível da lesão, no
procedimento cirúrgico e no exame físico do paciente.
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