Referência  em  FISIOTERAPIA  na  Internet

 www.fisioweb.com.br 


Trabalho realizado por:
Flávia Campos Quintão**
Denise Campos Andrade*
Lívia Cristina Lagôa*

 

A Síndrome do respirador oral, suas influências
na postura e a atuação da fisioterapia


Resumo

Através de uma breve revisão literária objetivamos estabelecer uma relação clara entre a respiração oral, suas conseqüências posturais e de que maneira podemos atuar enquanto fisioterapeutas. Ao mesmo tempo procurando dar ênfase à atuação preventiva e interdisciplinar.


Abstract
Across a short literary revision, our objective are establish a clear connection among oral breating, it?s oppereance consequences and how we can act while phisioterapy profissinals. At the same time ,we are trying to give emphasis to a preventive acting of the subject.



Palavras-chaves: respiração oral, alterações posturais, fisioterapia.

Key-words: oral breathing, posture desorders, phisiotherapy.



Introdução

A escolha do tema foi baseada na necessidade de uma abordagem mais completa sobre a síndrome do respirador oral e suas alterações, tendo em vista a escassa atenção dada a este assunto no conteúdo disciplinar dos cursos da área da saúde e consequentemente na prática clínica.

A síndrome do respirador oral, também conhecida como síndrome de Pierre Robin , é o conjunto de sinais e sintomas de quem respira parcial ou totalmente pela boca. É causada por algum tipo de obstrução nas vias aéreas superiores, má oclusão dentária ou maus hábitos, levando a um padrão suplente de respiração que, por sua vez, vai gerar uma série de outras alterações importantes na dinâmica corporal.

Temos na etiologia os fatores obstrutivos ( hipertrofia das adenóides ou das amígdalas, traumatismos faciais, corpos estranhos, sinusites, rinites, ronco, apnéia do sono, baba noturna) e os fatores relacionados aos maus hábitos ( sucção de dedos, chupetas, mamadeiras, costume de morder tampas de canetas e outros objetos). Um fato interessante é que a criança que recebe o leite materno ao invés de mamadeiras nos primeiros meses de vida tem mais probabilidade de ser um respirador predominantemente nasal durante a vida, acredita-se que o movimento de sucção ajuda a criança a respirar pelo nariz.
A criança que se alimenta somente com substâncias muito pastosas desenvolve hipotonia dos músculos elevadores da mandíbula levando à abertura da boca.

O respirador oral é portador de evidente desequilíbrio biomecânico, ficando o equilíbrio da postura comprometido pela desarmonia da cadeia osteomuscular.

A agressividade do ar inspirado altera o sistema de equilíbrio corporal definindo a expressão facial e o condicionamento físico típicos dessa síndrome, que serão abordados mais adiante. Todas as alterações estarão ligadas às descompensações posturais, podendo ser pulmonares, cardíacas, viscerais, comportamentais , dentre outras.


Fisiopatologia da síndrome do respirador oral

Para melhor compreensão deste item é necessária uma pequena revisão da fisiologia da respiração. A função dos pulmões é prover oxigênio e remover dióxido de carbono dos tecidos do corpo, para que isto ocorra são necessárias a ventilação e as trocas gasosas. Para ocorrer a ventilação, os pulmões, o sistema respiratório e a caixa torácica devem expandir-se acima do volume de repouso e retrair-se para este nível de repouso. Esse movimento só é possível quando força suficiente é aplicada para superar a retração elástica e resistência ao fluxo aéreo.

A passagem de ar pelo nariz é importante para que ocorra filtração, umedecimento e aquecimento do ar. Quando nascemos a respiração é predominantemente nasal, no decorrer da vida parte dela pode ser oral e com a atividade física mais intensa e freqüente ela tende a aumentar chegando a 60% da ventilação total.

A obstrução das vias aéreas provocada pelos fatores já citados faz com que a criança passe a ter uma respiração oral ( total ou parcial), o que é extremamente agressivo aos tecidos das vias aéreas, pois o ar não é filtrado, não é aquecido e nem umidificado. Se não tratada precocemente pode levar a um comprometimento severo dos pulmões, com infecções repetidas, podendo haver secreção espessa e até purulenta.

O mais comum é uma respiração mista: nasal e oral.

Torna-se importante dizer o que é o sistema estomatognático, uma vez que este estará alterado. Ele é o conjunto das seguintes estruturas: dentes, mandíbula, músculos, ossos, ligamentos, vasos sangüíneos, complexo neural, ATMs, que auxiliam na realização das funções vitais (mastigação, deglutição, respiração) de extrema sensibilidade e importância para a manutenção de todo o equilíbrio físico-biológico do homem (SCHINESTSCK & SCHINESTSCK, 1998). As alterações desse sistema provocam desequilíbrios que se manifestam na conformação dos órgãos.


As alterações

As queixas mais referidas pelos pacientes e/ou seus responsáveis se relacionam com as conseqüências e não com o problema em si.

Em primeiro lugar, ocorre modificação no posicionamento da língua e mandíbula, assim refletindo sobre a cabeça e o pescoço, alterando a postura corporal (ENLOW apud TOMÉ et al, 1996). Preconiza-se que esta alteração postural é devida aos mecanismos de cadeias e grupos musculares e articulares e é do conhecimento de todos que a cabeça relaciona-se à cintura escapular e esta à cintura pélvica a fim de proporcionar o reequlíbrio entre os segmentos para vencer a ação da gravidade, por isso tamanha relação.

A respiração oral leva à protusão de cabeça visando a manutenção da via respiratória pela necessidade de uma melhor respiração, através da retificação do trajeto das vias, favorecendo a chegada mais rápida do ar aos pulmões. Consequentemente, os grupos musculares tomam uma nova trajetória de função que passa a ser para frente e para baixo. Com a musculatura do pescoço e da nuca nesta nova orientação é comum ver a coluna cervical retificada.

A falta da passagem do fluxo aéreo pelas fossas nasais, a postura inadequada da língua no assoalho bucal e a diminuição do tônus dos músculos da face promovem a hipoplasia maxilar. Outra alteração ligada ao baixo tônus e à movimentação precária da musculatura da face (principalmente os levantadores da mandíbula) é a diminuição do crescimento da mandíbula, ocorrendo o rebaixamento e rotação posterior da mesma.

Quando a cabeça se anterioriza os ombros rodam internamente, deprimindo o tórax, levando a alterações no ritmo e na capacidade respiratória, pois o diafragma passa a trabalhar numa posição mais baixa e de forma assincrônica, o que ocasiona uma respiração mais rápida e curta, criando uma deficiência de oxigenação ( o volume corrente diminui associado à menor mobilidade do tórax).

A flacidez e a distensão da musculatura abdominal e do estômago ocorrem pela excessiva deglutição de ar, podendo provocar dores na região lombar. Além deste sintoma, é comum aparecerem problemas digestivos, de fígado, incontinência urinária, dentre outros, todos relacionados à ptose visceral.

Observa-se também olheiras e assimetria de olhos devidas ao sono intranqüilo e à baixa saturação de oxigênio. A face apresenta desenvolvimento assimétrico dos músculos, atresia do nariz (por falta de uso), descoloração da pele, lábio inferior curto e outros.

Ocorrem dificuldades na alimentação, a obesidade pode ser associada ao fato de que o paciente come muito rápido para poder respirar ou pelas refeições geralmente serem acompanhadas por muito líquido, além da preferência por massas, pois estas apresentam maior facilidade e rapidez para serem mastigadas e deglutidas. Já os pacientes magros são aqueles que geralmente não se interessam pela comida, pois durante a mastigação e deglutição pode ocorrer falta de ar (TOMÉ et al.,2001).

As mudanças cardioplumonares estão ligadas à compressão do tórax sobre a área cardíaca, alterando o mecanismo de bombeamento circulatório.

Outras modificações: hiperextensão de joelhos, genu valgo, arco plantar desabado e hálux valgo (CARVALHO, 2001), as escápulas ficam salientes, há depressão submamária, hipercifose torácica e hiperlordose lombar (FELÍCIO, 1999) todas com o objetivo de sustentar o peso corporal, já que seu eixo sofreu mudanças.

Vale ainda lembrar as modificações comportamentais: são crianças inquietas, impacientes, ansiosas, medrosas, irritadas constantemente e impulsivas. À noite, quase nunca querem ir para a cama, mesmo estando dormindo em frente à TV. Pela manhã, muito cansadas devido a pesadelos e dificuldades respiratórias, não querem sair da cama para estudar ou ir para a escola. Na escola, têm muito sono, não conseguem prestar atenção nas aulas a estão sempre cansados e deprimidos. Por causa da respiração rápida e curta apresentam cansaço constante a qualquer tipo de brincadeira ou atividade física. Têm enurese noturna, tropeçam e caem com freqüência.


Trabalhando a prevenção


É de fundamental importância incentivar a amamentação natural nos primeiros seis meses de vida do lactente, pois ela propicia a excitação neural simultânea das ATMs, o crescimento total da mandíbula, o ritmo da sucção, deglutição e respiração normais. O sinergismo muscular e o condicionamento postural responsáveis pelo bom funcionamento das estruturas ósseas e arcadas dentárias já precisam ser estimulados desde muito cedo.

Quanto mais cedo a criança desenvolve a síndrome da respiração oral, maiores são as chances de se instalarem deformidades no tórax, visto que sua plasticidade será ainda muito grande.

Outro fator onde se pode atuar é desenvolvendo um trabalho ergonômico dentro das instituições educacionais e de saúde. Deve-se sempre observar os hábitos viciosos e controlar o estresse, hoje muito freqüente entre as crianças, juntamente com a prevenção ortodôntica, fonoaudiológica e fisioterápica.



Fisioterapia


Primeiramente é necessário saber distinguir claramente causa e conseqüência, do contrário, serão feitas intervenções desnecessárias ou incongruentes que acabam levando a sérios prejuízos e ao agravamento dos sintomas. Essa distinção será feita durante a avaliação, que deve ser minuciosa, contendo anamnese, avaliação postural e oromiofacial. Devemos observar também alguns dos componentes do sistema estomatognático. A partir destes dados é possível elaborar os objetivos e traçar a conduta de tratamento. Cabe dizer que as abordagens serão individuais e partem da necessidade de cada paciente.

A importância do tratamento precoce da respiração oral, em conseqüência de um correto diagnóstico, é extremamente relevante para o sucesso do tratamento. E é claro que não se pode ignorar a importância da atuação multidisciplinar, na qual o objetivo é a melhor qualidade do atendimento.

>> Métodos terapêuticos

RPG? Trata o paciente de forma global , não visando somente a patologia, requerendo do mesmo uma participação ativa, usa estiramento dos músculos estáticos e fortalecimento dos dinâmicos, seguindo a cadeia que está causando dor e outros distúrbios. Neste método, a respiração mobiliza todos os músculos do tórax e atua em todos os sistemas e quando ela é desbloqueada os músculos relaxam, permitindo a melhora postural.

Hidrocinesioterapia: os efeitos físicos da água podem beneficiar a coordenação, equilíbrio muscular e diminuir o quadro álgico.

Alongamento Global (streching global ativo): é usado para pacientes que já obtiveram alta da RPG, mas que ainda necessitam de alongamento muscular.

Cinesioterapia Clássica: promove a reorganização da harmonia muscular por meio de relaxamento, alongamento e fortalecimento.

Exercícios Respiratórios: sua base fundamental é a reintegração sensorial dos movimentos do tórax e do abdome nas fases da respiração. A partir da conscientização dos detalhes de seus movimentos inspiratórios e expiratórios o paciente poderá controlar o ritmo, a freqüência e a profundidade da respiração, além de torná-lo menos ansioso e angustiado. Podemos associar exercícios diafragmáticos com exercícios de membros e tronco; em pé, deitado ou sentado; com bastões, faixas e incentivadores como TRIFLO, VOLDINE OU LÍNGUA DE SOGRA. Ou seja, o importante é a criatividade do fisioterapeuta.

É óbvio que não podemos deixar de atuar, em primeiro lugar, no agente obstrutivo quando possível, por exemplo, no caso de rinites, asmas e sinusites.



Conclusão

Em nossa breve discussão não foram observadas opiniões divergentes entre os autores consultados. Muitas se completam, enriquecendo o estudo dessa síndrome. Foi possível observar o quanto a respiração oral provoca alterações nos padrões posturais, trazendo assim conseqüências negativas na qualidade de vida do portador. Aos olhos da sociedade e da família a postura do respirador oral transmite uma sensação de sofrimento e de tristeza.

O trabalho conjunto é o ponto de partida para a solução dos problemas e sem a interdisciplinaridade a abordagem só trará insucessos, sempre lembrando da importância de uma boa avaliação que permita diferenciar causas e conseqüências para que, desta forma, seja possível uma conduta adequada de tratamento.

A síndrome do respirador oral é um problema muito complexo de se sanar devido aos múltiplos sintomas que surgem a cada dia, tornando cada vez mais freqüentes as manifestações que solicitam a atuação do fisioterapeuta.

A criança se torna um "patinho feio" que se destaca por toda a sua má postura. Portanto, ela merece atenção especial pois as conseqüências podem ser mais graves quanto mais tempo se retarda a intervenção.



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** Professora de Pneumologia da Unipac – Barbacena MG.

*Acadêmicas do curso de Fisioterapia da Universidade Presidente Antônio Carlos de Barbacena/MG. - Turma 2000-2004 - UNIPAC/BARBACENA.

 

Obs.:
- Todo crédito e responsabilidade do conteúdo são de seus autores.
- Publicado em 20/10/04

 


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