INTRODUÇÃO
Doença sempre implica um estado anormal do corpo, a respeito de estrutura ou
função de uma parte ou de todo o organismo. Pode ser temporária ou uma
deficiência permanente.
Infelizmente o sistema de defesa imune ocasionalmente pode funcionar mal, e
alguns elementos do mecanismo de defesa reagem contra partes do corpo.
As doenças reumáticas constituem uma das causas mais comuns de dor,
incapacidades e perdas econômicas.
Quebrando este mito que as doenças reumáticas acometem somente o Sistema
Osteoarticular, muitos pacientes/clientes apresentam queixas relacionadas aos
outros órgãos como: rins, coração, pulmões, pele...
As causas são desconhecidas, e a interação de múltiplos agentes é provável.
MECANISMO DA DOENÇA AUTO – IMUNE
Sendo uma doença de imune complexo, os tecidos autólogos são lesados como
“espectadores inocentes”. Os auto-anticorpos não são dirigidos contra os
componentes celulares do órgão-alvo, mas sim contra o antígeno, autólogos ou
heterólogos do soro. Os complexos (Ag+Ac) resultantes ligam-se
inespecíficamente a membrana ou autólogas e fixam complemento. A fixação e
subseqüente ativação dos componentes do complemento produzem uma resposta
inflamatória local que resulta em lesão tissular.
DEFINIÇÃO
A Síndrome de Behçet recebeu o nome do dermatologista turco Prof. Dr. Hulusi
Behçet (1889-1948).
Uma enfermidade reumática de evolução crônica, que tem a capacidade de
produzir inflamação a nível de grandes vasos sanguíneos, por isso é
considerada uma Vasculite Sistêmica.
Foi descrita em 1937, o Dr. Behçet publicou seus achados clínicos como um
complexo de sintomas triplos de úlceras orais, urogenitais, e lesões de pele.
Em 1947, a síndrome foi reconhecida no Congresso Nacional de Dermatologia.
Dr. Hulusi Behçet
ETIOLOGIA
É uma doença rara, mas uma das primeiras descrições foi por Hipócrates na
antiga Grécia, em 450 a.C que relatou pessoas com ulcerações aftosas, oculares
e genitais recorrentes.
Mas há um consenso que esta doença geralmente afeta pessoas oriundas do
Mediterrâneo e do Leste como China e Turquia, um sinônimo do seu nome é Doença
da Rota da Seda.
Segundo pesquisadores como os médicos Benedictos Adamantiades (1931), Tommas
(1989), Castro (1995) e entre outros, é uma desordem multissistêmica
inflamatória rara de provável natureza auto-imune, que apresenta clínica
específica e às vezes incapacitante.
INCIDÊNCIA
* Idade: Grande em adultos entre 20 a 30 anos, mas acomete crianças.
* Raça: Grupos raciais diferentes e variados prognósticos, mas é baixa
em países ocidentais, e em negros.
* Sexo: Ambos os sexos, mas o masculino é mais afetado.
* Herança: Admite uma base imunogenética devido relação com certos
tipos de HLA-B (Antígeno Leucocitário Humano).
* Outros: Alguns tipos de alimentos podem desencadear as aftas, e as
bactérias estimularem o sistema imunológico local, acarretando nos sintomas.
FISIOPATOLOGIA
A característica da doença é composta por várias afecções, de evolução crônica
cujos sinais e sintomas podem aparecer de modo insidioso ou abrupto, com
acometimento de vários órgãos.
Uma patologia relacionada à imunidade, resultado de uma inflamação sistêmica
dos vasos sanguíneos de grandes calibres onde há deterioração e obstrução do
fluxo de sangue e dano na parede vascular.
CLÍNICA
Considerada como uma Artropatia Soro Negativa (FR-), a tríade característica é
composta por ulcerações orais, genitais e lesões oculares.
A evolução clínica como já foi dito é crônica, porém se manifesta
freqüentemente por remissões e exacerbações.
Acomete os sistemas:
* Tegumentar: pele e mucosa, eritemas nodosos, úlceras dolorosas e de
superfície com pseudomembrana amarelada.
* Osteoarticular: Artrite assimétrica oligoarticular periférica de MMII,
auto limitada e deformante, que afeta geralmente joelhos e tornozelos. A
predileção à destruição de superfícies articulares se apresenta naqueles
sítios submetidos aos maiores suportes de carga ou estresse de cisalhamento.
* Extrarticulares: uretrites, uveíte anterior, conjuntivite, esclerite
e retinite.
Obs: A SB tem uma probabilidade quatorze vezes maior de manifestar
complicações trombóticas arteriais e venosas profundas, aneurismas, e
infecções gastrintestinais.
O comprometimento do SNC resulta muitas vezes em invalidez acentuada ou morte,
as manifestações podem incluir paralisia de nervos cranianos, convulsões,
encefalites, distúrbios mentais e lesões medulares em casos mais avançados,
hipópio e neurite do nervo óptico (que surgem por causas metabólicas na SB).
São freqüentes a leucocitose e o aumento da velocidade de hemossedimentação.
QUADRO CLÍNICO
Permite um diagnóstico através de conjuntos de critérios de classificação bem
definidos.
1. Ulcerações Orais recorrentes (Pelo menos três vezes em um ano).
2. Ulcerações Genitais recorrentes.
3. Lesões Oculares (uveíte antero-posterior, células no vítreo ou vasculite
retiniana).
4. Lesões Cutâneas (eritema nodoso, pseudofoliculite, lesões populopustulares
ou acneiformes).
5. Teste de Patergia positivo.
>> Um paciente/cliente pode ser classificado como portador da SB quando o
critério 1 está presente, associado a quaisquer dois dos demais critérios, não
necessariamente de forma simultânea.
Fonte: International Study Group for Behçet’s Disease,1990.
Obs: A escala da dor varia muito da área da lesão, do tecido acometido.
SINAIS E SINTOMAS
* Extrarticulares
A) ÚLCERAS ORAIS (AFTAS): São recidivantes em 100% dos casos, são
dolorosas, de tamanho e aspecto variáveis, aparecem no palato mole, língua, e
orofaringe. Desaparecem por volta de 10 dias sem deixar cicatrizes.
Aftas ou Úlceras Orais
Úlceras com Pseudomembrana Amarelada
B) ÚLCERAS GENITAIS: As úlceras nos homens
são mais no escroto que no pênis, nas mulheres se apresenta no orifício
uretral, que fica visivelmente afetado e a extensão perineal também, como o
bulbo do vestíbulo e os lábios. São dolorosas, geralmente maiores, e mais
profundas deixando cicatrizes.
A SB não é contagiosa e não se transmite sexualmente.
>> A uretrite, que ocorre muita das vezes, é inflamação na uretra que pode ser
causada pela bactéria Chlamydia, intracelular semelhante a vírus.
Úlceras no Pênis e próximo ao Escroto (Virilha)
Úlceras na Extensão da Vagina e algumas Nodosas
C) LESÕES OCULARES: As uveítes estão presentes em 60 a 70% dos casos, uma
inflamação do trato uveal não granulomatosa de inicio agudo, dor pronunciada
ao redor da córnea, e vermelhidão.
As aderências impedem o fluxo do humor aquoso levando ao glaucoma, podendo
determinar o aparecimento de cataratas, seguindo fulminantemente para a
cegueira.
Obs: O sexo masculino é mais afetado, sendo a uveíte bilateral mais freqüente
em 88% dos casos, e a unilateral em 12%.
Lesões Oculares (Uveítes e Hipópio)
D) LESÕES CUTÂNEAS: Implicam 80% dos casos, com foliculites, pústulas,
vesículas, furúnculos...
Lesões Cutâneas (Pseudofoliculites)
* Intrarticular
E) ARTRALGIA E ARTRITE: São uma causa secundária na SB, observadas em cerca de
2/3 dos pacientes/clientes, em 65% dos casos, a artrite não é erosiva, mas se
não for tratada, depois de meses ou anos pode instalar-se espessando o tecido
periarticular, podendo ocorrer atrofia de pele e dos músculos.
Obs: Os sinais e sintomas podem durar dias ou semanas
Ressonância Nuclear Magnética mostrando paciente com Artrite no Joelho
A FISIOPATOLOGIA DA DESTRUIÇÃO ARTICULAR
Inflamação na Articulação (Sinovite) ==> Derrame Sinovial ==> Tecido de
Granulação Recobre a Cartilagem (Pannus) ==> Destruição da Cápsula Articular e
Osso Subcondral ==> Dor ==> Perda da Mobilidade Articular
==> Fraqueza dos
Músculos Periarticulares ==> Lesões Tendinosas e Ligamentares ==>
Instabilidade e Deformidade da Articulação ==> Disfunção e Desuso da
Articulação ==> Atrofias Musculares e Deformidades por Contraturas.
Comparação entre um Joelho Normal e um com Osteoartrite (Cão)
DIAGNÓSTICO E AVALIAÇÃO
Não há testes laboratoriais ou histopatológicos que fornecem o diagnóstico de
certeza da doença, esta se baseia através dos critérios, além de poder contar
ainda com a reação de Patergia (Ressaltando que é um teste que apresenta uma
baixa sensibilidade, além de ser inespecifico).
Critérios Clínicos para a Avaliação da Atividade da Síndrome de Behçet
* Úlceras genitais e orais.
* Eritema nodoso e pústulas.
* Artralgias e
artrite.
* Náuseas ou vômitos.
* Diarréia e cefaléias.
* Sinais ou sintomas de
atividade ocular.
* Sinais ou sintomas de atividade do SNC em grandes vasos.
*
Auto-avaliação do paciente/cliente (Sobre escala semiquantitativa).
*
Impressão geral da clínica (Sobre escala semiquantitativa).
>> A presença dos critérios acima é utilizada para quantificar a atividade da SB,
e um índice produzido pela soma simples dos critérios positivos.
Porém, as validades deste índice entre diferentes centros ainda não foram
convenientemente avaliadas.
Fonte: Lawton, 2004.
TESTE DE PATERGIA
É uma reatividade cutânea a traumas mecânicos repetitivos, feito com picadas
de agulha, de 3 a 5, o local é demarcado para inspeção. Após 24 ou 48 horas
das picadas surgem pústulas ou bolhas, o teste é positivo em cerca de 60 a 70%
dos casos.
Teste de Patergia com Reação Positiva
PROTOCOLO DE TRATAMENTO CONSERVADOR FUNCIONAL
Como a causa é desconhecida, o tratamento é realizado de acordo com os
sintomas individuais.
* Terapêutica Medicamentosa: Os corticóides tópicos e orais, antiinflamatórios
não esteróides, analgésicos e outras drogas imunossupressoras têm sido
empregadas com êxito, nas lesões cutâneas e ulcerações.
* Terapêutica Osteoarticular: A fisioterapia consiste em reduzir a dor e o
processo inflamatório, preservar a função, evitar seqüelas e prevenir
deformidades.Contribuindo para o conforto do paciente/cliente, e o seu
bem-estar.
FISIOTERAPIA NAS ARTICULAÇÕES ARTRÍTICAS
O pré-cinético e o cinético são recomendados para manter a mobilidade e
prevenir a fibrose articular.
> PRÉ-CINÉTICO
Visando combater a reatividade, o repouso sempre será bem vindo, por causa da
vasodilatação no processo inflamatório.
Eletrotermofototerapia:
1. TENS: para analgesia, com liberação de opiáceos naturais a nível cortical
promovendo relaxamento.
2. Crioterapia: Com o segmento a ser tratado em drenagem postural, para
facilitar o retorno venoso, e dando um intervalo de 10 a 15 minutos, para usar
as outras técnicas pré-cinéticas ou cinéticas.
Obs: Sempre realizar o teste, para detectar a reação na pele de papúla.
3. Ultra-Som (Pulsátil): Tem o mesmo efeito do LASER, só é mais lento,
prevalecendo o efeito mecânico e secundariamente o térmico.
NB. LASER – AsGa: para a fotobiomodulação, e tem efeito profundo, mas com uso
de corticóides fica contra indicado, por alguns estudos comprovarem isso.
4. Contraste: Promovendo a ginástica vascular.
> CINÉTICO
As mobilizações passivas e ativas precisam ser estimuladas para eliminar a
rigidez, e aumentar do arco de movimento, empregando juntamente exercícios
isométricos, isotônicos, e resistidos. Com o terapeuta fornecendo supervisão
direta e assistência física.
Cinesioterapia:
1. Massagem Sueca Neoromuscular: Preparando a região para outras manobras, com
efeitos calmantes e energéticos, aumentando a circulação geral, observando
sempre a Lei do Ritmo.
2. Mobilização Mio-Fascial: Para alongamento tecidual, equilibrando os dois
lados, oferecendo tensão as fáscias.
3. Técnica de Mulligan: Manual, indicada para hipomobilidade intra-articular,
sem dor, realizando movimentos acessórios.
4. Técnica de Codman: Usada para evitar aderências, e melhorar o suprimento
sanguíneo.
5. Técnica de Maitland: Para restabelecer a função e inibir a dor
passivamente, com micro-movimentos articulares.
6. Bola Suíça: com o objetivo de isometria, isotonia, treino postural e
mobilizações lúdicas, principalmente com crianças.
7. Hidroterapia: È ideal para as patologias reumáticas, mas tendo a restrição
de só ser feita quando as lesões e as úlceras estiverem cicatrizadas.
8. MARP: Fazendo uma morfo-ánalise e seu reagente postural, trabalhando os
três pilares: corpo real, o emocional e o vivenciado, através do toque.
9. Técnicas de Relaxamento:
* Jacobson, que visa um relaxamento progressivo, para a normalização da
cinestesia, reduzindo a excitabilidade cerebral, colocando o córtex em
repouso.
* Shultz, para um autocontrole, diminuindo a algia. É induzido por exercícios
fisiológicos racionais, levando ao relaxamento neuromuscular.
CONCLUSÃO
Por ter uma etiologia duvidosa a Síndrome de Behçet, tem que ser tratada a
partir do momento que for diagnosticada, mas não esquecendo que todos os
protocolos de tratamento têm suas indicações e contra-indicações.
O paciente/cliente portador da SB tem que ser atendido por uma equipe
multidisciplinar, englobando médicos nas áreas especificas de cada lesão,
fisioterapeutas, psicólogos, e contar com uma assistência social, enxergando
este ser como um todo.
Os profissionais têm que saber que eles estão presentes nas questões
culturais, sociais na vida e no sofrimento, lembrando que todos os
pacientes/clientes desejam falar de sua doença, seja em nível de curiosidade
ou conforto emocional.
“A importância da intervenção precoce da fisioterapia não pode ser
superestimada. As deformidades não são sempre inevitáveis. Mas a educação
preventiva ao paciente/cliente é a consideração mais importante na preservação
articular. Isso envolve ensiná-lo realizar as atividades diárias usando
técnicas que irão evitar e prevenir um desgaste desnecessário nas estruturas
articulares envolvidas e também para conservar a energia”.
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