Resumo
Este artigo diz respeito as afecções músculoesqueléticas ocasionadas por
sobrecargas biomecânicas que vêm sendo observadas nos últimos anos em todas as
classes trabalhistas em nosso país, sendo considerada nos dias de hoje uma
epidemia mundial denominada como LER/DORT. Estas afecções têm sido, na área da
saúde, pauta de discussão e debates buscando soluções tanto para prevenir como
para tratar pessoas portadoras dessa patologia.
Palavras-chaves: Epidemia, LER/DORT, Tratamento.
Introdução
As Lesões por Esforço Repetitivo (LER) ou Distúrbios Osteomusculares
Relacionados ao Trabalho (DORT) tornaram-se a mais nova epidemia dos últimos
anos, já que a partir da década de 80 passaram a ser a mais freqüente causa de
afastamento do trabalho no mundo.
Os termos LER/DORT são usados para determinar as afecções que podem lesar
tendões, sinóvias, músculos, nervos, fáscias, ligamentos, de forma isolada ou
associada, com ou sem degeneração dos tecidos, atingindo principalmente membros
superiores, região escapular e pescoço. Decorrente de uma origem ocupacional ela
pode ser ocasionada de forma combinada ou não do uso repetido e forçado de
grupos musculares e da manutenção de postura inadequada (CODO E ALMEIDA, 1998).
Além do uso repetitivo, a sobrecarga estática, o excesso de força para execução
de tarefas, o trabalho sob temperaturas inadequadas ou o uso prolongado de
instrumentos com movimentos excessivos podem contribuir para o aparecimento das
enfermidades músculoesqueléticas. Assim sendo, a sigla LER ( lesão por esforço
repetitivo) é insatisfatória, pois não determina outros tipos de sobrecarga que
podem trazer prejuízo ao aparelho locomotor, dessa forma, a LER adquiriu um
estigma negativo, passando a ser designada DORT (Distúrbios Osteomusculares
Relacionados ao Trabalho) (ZILLI,2002). O termo permitiu ampliar os mecanismos
de lesão, não só restritos aos movimentos repetitivos, mas que também
cincunscreve formas clínicas peculiares a algumas atividades ocupacionais e
ainda propõe o estabelecimento do nexo causal classificando-o como doença
ocupacional (VIEIRA, 1999).
Histórico
Acompanhando a história das doenças ocupacionais, facilmente se percebe que as
LER/DORT são temas de pesquisa e discussão há muitos anos.
Com o advento da era industrial, teve início o processo de fabricação de
produtos em massa, e a crescente especialização dos operários no sentido de
melhorar a qualidade, aumentar a produção e também reduzir custos. Essa
especialização levou os trabalhadores a executarem funções específicas nas
empresas, com a realização de movimentos repetitivos, associados a esforço
excessivo, levando muitos trabalhadores a sentir dores (NAKACHIMA, 2002).
Segundo Moreira e Carvalho (2001) o professor italiano Bernardino Ramazzini,
considerado pai da medicina ocupacional, forneceu a primeira contribuição
histórica, em 1713, fundamentando em 54 profissões de sua época. Nesse trabalho
ele não só identificou os distúrbios, mas também traçou uma causa ocupacional.
Ele acreditava que as lesões encontradas em escreventes eram causadas pelo uso
repetitivo das mãos, pela posição das cadeiras e pelo trabalho mental excessivo.
No século seguinte, foram descritos na Europa quadros clínicos afetando o
esqueleto axial e periférico de trabalhadores que desempenhavam distintas
tarefas laborativas. Na época esta sintomatologia foi chamada de “cãimbras
ocupacionais”. Entre as várias atividades ocupacionais envolvidas, salientava-se
a “cãimbra do escrevente”, que atingiu níveis de epidemia no serviço civil
britânico em 1833 (MOREIRA E CARVALHO,2001).
Em 1888, o neurologista William Gowers relatou casos de trabalhadores com
sintomas de ansiedade, de insatisfação com o trabalho ou do peso de
responsabilidades. Ressaltou ainda a instabilidade emocional desses indivíduos e
admitiu sua grande dificuldade em distinguir uma neurose de um quadro de
simulação de doença. Desde então, diversos países industrializados têm passado
por epidemias de diagnósticos envolvendo tais distúrbios (MOREIRA E
CARVALHO,2001).
Epidemiologia
A diversidade de conceitos observados na literatura dificultam a obtenção
concreta de dados para o estudo da incidência e da prevalência dos diferentes
tipos de doenças e das condições clínicas das chamadas LER/DORT, que costumam
surgir em rápidas escaladas na forma de surtos. Uma outra dificuldade é que os
estudos na sua grande maioria não têm a colaboração de empresas e seus
empregados pelo medo de exposição e o risco de demissões de seus cargos.
Segundo Moreira e Carvalho (2001), as estatísticas do Conselho Nacional de
Segurança dos EUA, a indenização referente aos DORT é 50% mais custosa que a
reinvindicada por trauma agudo (acidente de trabalho). O tempo perdido de
trabalho nos pacientes com DORT nos EUA é extremamente maior do que com os
outros distúrbios músculoesqueléticos, como, por exemplo, a dor lombar.
Existem inúmeros trabalhadores com queixas de dor atribuída a seu trabalho. A
patologia é reconhecida pela atual legislação brasileira gerando grande
interesse nos meios médicos. O ônus gerado ao governo, às indústrias e aos
trabalhadores, levam os meios médicos a realizar estudos e discussões que possam
contribuir para uma melhor compreensão dessa patologia já considerada como
epidemia na saúde brasileira (NAKACHIMA, 2002).
No Brasil, os dados dessas afecções são deficientes, mas a quantidade de
diagnósticos de LER/DORT tem dimensões muito altas. Considerando assim que na
última década nosso país presenciou uma situação epidêmica com relação aos DORT,
tornando-se esta patologia a segunda maior causa de afastamento do trabalho no
Brasil. Somente nos últimos 5 anos foram abertos 532.434 CATs (Comunicação de
Acidente de Trabalho) geradas pelas LER/DORT. A cada 100 trabalhadores da região
Sudeste do Brasil, 1 é portador de LER/DORT (AMERICANO, 2001).
Num estudo realizado na cidade de São Paulo, onde foram examinados 1.560
pacientes, o sexo feminino representou 87% dos casos; sendo que a faixa etária
mais afetada oscilava entre 26 e 35 anos (MOREIRA E CARVALHO, 2001).
Em outro estudo realizado pela Cassi (Caixa de Assistência aos Funcionários do
Banco do Brasil) no ano de 2000, 26,2 % dos funcionários do Banco do Brasil
apresentaram algum sintoma que está relacionado à LER/DORT (AMERICANO, 2001).
Vários fatores vêm impulsionando a enorme quantidade de diagnósticos de LER ou
DORT em nosso país, entre eles: tensão social; alto índice de desemprego;
predisposição ética; falta de organização no ambiente de trabalho; influência da
ação de sindicatos; ações políticas; oportunismo de advogados; influência da
mídia; interesses por indenizações ou aposentadorias.
Etiologia
Quando um indivíduo apresenta uma lesão ocasionada por sobrecarga biomecânica
ocupacional, os fatores etiológicos estão associados à organização do trabalho
envolvendo principalmente equipamentos, ferramentas, acessórios e mobiliários
inadequados; descaso com o posicionamento, técnicas incorretas para realização
de tarefas, posturas indevidas, excesso de força empregada para execução de
tarefas, sobrecarga biomecânica dinâmica; uso de instrumentos com excessos de
vibração, temperatura, ventilação e umidade inapropriadas no ambiente de
trabalho (MOREIRA E CARVALHO,2001).
Sabe-se então que um ambiente de trabalho organizado, com pessoas bem treinadas
e condicionadas com respeito aos fatores ergonômicos e aos limites biomecânicos
certamente diminuem o risco de desencadeamento das chamadas LER/DORT (MOREIRA e
CARVALHO, 2001).
Distúrbios mais freqüentes
Alguns dos principais distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho
citados por Couto (1998) são: tendinite e tenossinovite dos músculos dos
antebraços, miosite dos músculos lumbricais e fasciíte da mão, tendinite do
músculo bíceps, tendinite do músculo supra-espinhoso, inflamação do músculo
pronador redondo com compressão do nervo mediano, cisto gangliônico no punho,
tendinite De Quervain, compressão do nervo ulnar, síndrome do túnel do carpo,
compressão do nervo radial, síndrome do desfiladeriro torácico, epicondilite
medial e lateral, bursite de cotovelo e ombro, síndrome da tensão cervical e
lombalgia.
Fatores de Risco
Para identificar e abordar as causas de LER/DORT é necessário considerar vários
aspectos do ambiente de trabalho. Os fatores psicossociais, incluindo o estresse
na situação de trabalho e o clima organizacional da empresa podem influenciar a
eficácia das medidas preventivas. Os principais fatores de risco são:
organização do trabalho, riscos psicossociais, riscos ambientais, fatores
biomecânicos e fatores extra-trabalho (ZILLI, 2002).
Avaliação Clínica
O paciente portador de LER/DORT deve ter os locais onde há dor examinados como
também ser submetidos ao exame físico global do sistema múculoesquelético, pois
afecções músculoesqueléticas cervicais e lombares podem ser causas ou fatores
agravantes da dor. Os sintomas e os padrões clínicos que expressam a LER/DORT
são variados, freqüentemente vagos e muitas vezes inespecíficos, pois várias
estruturas músculoesqueléticas e nervosas podem estar comprometidas isolada ou
associadamente (CODO e ALMEIDA, 1998).
Tratamento e prevenção
O insucesso dos programas de terapêutica da LER/DORT deve-se a falha no
diagnóstico das reais etiologias da dor, da incapacidade e dos fatores que
contribuem ou agravam o quadro doloroso, sendo assim, a identificação das
estruturas lesadas é importante para o melhor resultado no tratamento (CODO e
ALMEIDA, 1998).
O tratamento depende sempre de um diagnóstico correto, da eliminação completa
dos agentes causais e de uma adequada estratégia terapêutica medicamentosa,
fisioterápica e, em alguns casos, cirúrgica (MOREIRA e CARVALHO, 2001).
O tratamento fisioterápico consiste em: termoterapia (calor profundo como ondas
curtas ou ultra-som), eletroterapia, massagens, cinesioterapia, hidroterapia,
órteses, RPG e outras técnicas. O fisioterapeuta deve levar em consideração
tanto o estágio evolutivo da doença, como as respostas do paciente a tratamentos
anteriores (PEROSSI, 2001).
Apesar da abordagem terapêutica ampla, muitos pacientes permanecem sintomáticos,
particularmente aqueles com diagnóstico de depressão, que estão insatisfeitos
com seu trabalho, que acreditam ter adquirido “lesões” através das atividades
desse trabalho e que estão envolvidos em alguma causa trabalhista.
O fisioterapeuta deve, no tratamento, ensiná-lo a relaxar, ir direcionando-o a
tomar consciência de seu corpo. Orientá-lo a “escutar” os sintomas que lhe dizem
o limite de seu corpo e a postura errada. Partindo dessa tese o paciente
consegue melhorar seu desempenho pessoal, minimizar tensões musculares, tirar a
atenção da dor e principalmente perceber suas limitações (PEROSSI, 2001).
A implementação de medidas preventivas é a melhor atitude a ser empregada,
existe uma necessidade de melhorar a educação dos trabalhadores com condutas de
orientação recomendações e de comunicações das experiências dos profissionais de
saúde. É essencial que os trabalhadores tenham um bom ambiente de trabalho, com
aperfeiçoamento técnico para realização de suas tarefas com respeito aos fatores
ergonômicos e antropométricos, aos limites biomecânicos, à duração das jornadas
e dos intervalos de trabalho, e com atitudes de reconhecimento de seus cargos
superiores (MOREIRA e CARVALHO, 2001).
Conclusão
O enorme contingente de diagnósticos LER/DORT existente no nosso país atinge
proporções consideradas epidêmicas. Conclui-se que ações dos vários segmentos da
sociedade trabalhista sejam responsáveis pelos fatores que vêm sustentando esse
fenômeno.
Sendo assim, o mais importante é a conscientização dos empregadores em orientar
seus empregados tanto na prevenção quanto na terapêutica dos distúrbios
músculoesqueléticos.
Referências
- AMERICANO, Maria José. Prevenção às LER/DORT - Site da Web:
www.2.uol.com.br/prevler/o_que_eh.htm, Acessado em 23/08/2005.
-
- CODO, Wanderley; ALMEIDA, Maria C. de – LER – Lesões por Esforços
Repetitivos. 4ª edição, 1998.
-
- COUTO, Ha – Como Gerenciar a Questão das LER/DORT,1998.
-
- MOREIRA, Caio; CARVALHO, Marco Antônio P.- Reumatologia Diagnóstico e
Tratamento. 2ªedição, 2001.
-
- NAKACHIMA, Luis Renato – Lesões por Esforços Repetitivos ou Distúrbios
Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - Site da Web:
www.fundacentro.gov.br/CTN/forum_maos_ler_dort.htm. Acessado em 18/08/2005.
-
- PEROSSI, Sandra C.- LER/DORT-Abordagem Psicossomática na Fisioterapia.
In: Revista Fisio &Terapia, nº27 – 2001.
-
- SANTOS, Eduardo Ferro; OLIVEIRA, Karine Borges – Gerenciamento Ergonômico.
In: Revista FisioBrasil, nº66 Julho/Agosto, 2004.
-
- VIEIRA, Lucia Marinez – Artigo: Prevenção das LER/DORT em pessoas que
trabalham sentados e usuários de computador, 1999. Site da Web:
www.pclq.usp.br/jornal/prevencao.htm, acessado em 18/08/2005.
-
- ZILLI, Cynthia M. – Manual de Cinesioterapia /Ginástica Laboral, 2002.
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